José Francisco Lacerda, O Chico Diabo
Ocupação
Militar Brasileiro
Data do Nascimento
1848
Data da Morte
1893 (45 anos)
Existem figuras na história que desafiam uma única interpretação. Personagens cujos feitos são celebrados por uns e condenados por outros. Esse é o caso de José Francisco Lacerda, o lendário Chico Diabo, um nome que ecoa de forma muito diferente no Brasil e no Paraguai.
No Brasil, Chico Diabo é reverenciado como um herói nacional, eternizado por sua atuação na Guerra do Paraguai. No entanto, se você perguntar a um paraguaio, a figura de Chico Diabo se transforma: ele é visto como o grande vilão, responsável pela morte de Francisco Solano López, um líder que, para os paraguaios, é um herói. Mas quem foi, de fato, Chico Diabo? E como um mesmo homem pode ter legados tão distintos?
Da Infância Pobre à Violência: O Apelido Que Pegou
Nascido em Camaquã, Rio Grande do Sul, em 1848, Francisco Lacerda era um menino vindo de uma família humilde. Aos 15 anos, ele teve seu primeiro e traumático contato com a violência. Trabalhando em uma carniçaria, permitiu que um cachorro entrasse no açougue. Furioso com o prejuízo, o patrão, um italiano rígido, começou a espancá-lo brutalmente.
Conta a lenda que, em um ato desesperado de autodefesa, Chico agarrou uma faca e, em meio à luta pela própria vida, matou seu agressor. Amedrontado, ele correu para casa. Sua mãe, ao vê-lo subir a rua, o reconheceu e, chocada com a situação, teria exclamado: “Diabinho!”. O apelido pegou, e o menino Francisco se tornou, para sempre, Chico Diabo.
Do Medo à Guerra: A Chegada ao Universo Militar
Com medo das consequências do assassinato, o jovem Chico foi enviado para a propriedade de seu tio Vicente Lacerda, em Bagé. Foi ali que seu destino tomaria um rumo inesperado. Em 1865, em meio ao recrutamento para a Guerra do Paraguai, os Voluntários da Pátria visitaram a fazenda de Vicente. Convidado pelo coronel Joca Tavares, Chico Diabo, com apenas 17 anos, aceitou se alistar.
Anos de combates se seguiram. Em 1870, o soldado e seus companheiros foram enviados para a Batalha de Cerro Corá, o desfecho sangrento da Guerra do Paraguai. Foi nesse cenário de caos que Chico Diabo, já promovido a cabo, realizaria o feito que o consagraria (ou o vilanizaria, dependendo do ponto de vista).
O Golpe Final: A Morte de Solano López
Em meio ao terrível embate de Cerro Corá, com cavalos galopando e armas brandindo por todos os lados, Chico Diabo desferiu um golpe decisivo. Sua lança, longa e afiada, perfurou o corpo do ditador paraguaio Francisco Solano López. Para selar o destino do líder, o gaúcho João Soares ainda o alvejou com seu revólver. Era o fim de um homem que, para o Paraguai, era um herói que lutou até o fim pela sua nação, mas que para o Brasil, era um líder sanguinário responsável por uma guerra devastadora.
Após o conflito, muitas teorias surgiram. Alguns diziam que Chico Diabo teria descumprido ordens ao matar Solano. Outras fontes, contudo, indicam a existência de uma recompensa de cem libras de ouro para quem desse fim ao ditador.
O Herói Recompensado e o Legado Contado
Pelo seu “grande feito”, Chico Diabo recebeu cem cabeças de gado e reivindicou a faca que Solano usava no dia do combate – um troféu simbólico de sua vitória. Em 1871, o gaúcho voltou ao Brasil, casou-se com sua prima e formou uma família. Seus descendentes vivem até hoje, e a história de Chico Diabo é passada de geração em geração na tradição oral do Sul.
Em 2014, a tataraneta de Chico, Carmen Lacerda Vargas, compartilhou sua visão com o G1: “Não vejo ele como herói. Acho que ele queria o dinheiro [da recompensa pela cabeça de Solano], na verdade. Mas também não acho que ele tenha sido o vilão da história.”
A vida de José Francisco Lacerda, o Chico Diabo, chegou ao fim em 1893, enquanto prestava serviços para Joca Tavares no Uruguai. Sua narrativa, seja a de um vilão, seja a de um herói, permanece marcada na história brasileira, um testemunho da complexidade dos conflitos e das figuras que os moldam.
História de Chico Diabo daria um bom documentário!